Teologia da Espiritualidade: evangelicalismo, liberalismo, pentecostalismo e neopentecostalismo

Billy Graham


O evangelicalismo


“Evangelicalismo” é o nome de uma tendência surgida dentro do protestantismo, e que se insere em diversas denominações, e que possui algumas características que lhes são peculiares, por suas ênfases. Por ser uma tendência muito grande no protestantismo, principalmente de fala inglesa e na América Latina, e que ocasionou o surgimento de muitas igrejas chamadas “livres”, é de grande importância conhecer um pouco em algumas de suas características.

Leia também: A espiritualidade protestante  

Uma de suas características mais marcantes é a ideia de conversão pessoal. Não basta o fiel participar por tradição de uma determinada comunidade. É necessário de que ele tenha certeza de que “nasceu de novo” para uma nova vida. Por conta disso, existe um grande incentivo à prática evangelística e missionária, de proclamação pessoal e desafiante do evangelho para cada criatura deste mundo.

Outra ênfase é a necessidade do fiel participar ativamente de uma comunidade celebrante, seja com sua ativa participação, seja com sua contribuição financeira, e não somente com visitas ocasionais, incentivando-o principalmente a guardar o domingo, o “dia do Senhor” para tal fim. O evangelista Billy Graham é um bom exemplo desta tendência no protestantismo mundial.

As igrejas e movimentos evangélicos comprometidos com o Pacto de Lausanne procuram também acrescentar em sua agenda uma forte preocupação com a ação social e política, no sentido de transformar toda a sociedade à luz da ideia do reino de Deus. Mas alguns anos depois do referido congresso ter sido pela realizado pela primeira vez (1974) não se pode dizer com toda certeza de que a maior parte do movimento evangélico tenha imprimido em sua espiritualidade esta preocupação com a questão social de maneira mais efetiva.

O liberalismo protestante

Fruto do iluminismo, o liberalismo teológico obedeceu à tendência de se analisar os conteúdos da fé à luz da ciência, recusando todo aspecto sobrenatural da fé (nascimento virginal de Cristo, milagres, existência de demônios, etc), analisando-a mais em termos culturais, psicológicos e sociais, e recusando conferir caráter infalível às Escrituras Sagradas, às doutrinas e dogmas tradicionais do cristianismo, conferindo-os mais um caráter simbólico. Também não consideram completamente infalível o sistema moral tradicional do cristianismo, havendo grande flexibilidade. Esse modo de fazer teologia tem sua origem no protestantismo, influenciando também o que se convencionou chamar de “modernismo” católico.

Como fruto de tal tendência, houve o desenvolvimento da ideia da não exclusividade da fé cristã como caminho de salvação à humanidade, crescendo com isso a ideia de um amplo ecumenismo[1] e a total tolerância com toda e qualquer religião. Daí, não há por parte de quem adote esta tendência o esforço evangelístico ou missionário, no sentido tradicional do termo, em sua espiritualidade.

Ante a não existência do fator sobrenatural, há bastante apreciação da arte litúrgica na espiritualidade de quem aborda este tipo de teologia. Esta inexistência do fator sobrenatural talvez seja um motivo da existência de um forte senso ético e social, no sentido de transformar a sociedade à luz do amor e da liberdade, ainda que para isso movimentos revolucionários e armados precisassem ser apoiados. Por não existir, para esta forma de pensamento, nenhum tipo de intervenção sobrenatural do divino no cotidiano humano, a oração se torna mais um tipo de meditação pessoal, no sentido do fiel encontrar Deus na base de seu próprio ser (Tillich). Alguns dos autores que procuram dar mais um sentido prático para este tipo de abordagem é o bispo anglicano John Spong.

Não é incomum conservadores de todas as tendências olharem, por estes e outros motivos, com desconfiança para aqueles que adotam e proclamam tal tipo de teologia, considerando-os inclusive, inimigos da fé considerada ortodoxa. Cumpre lembrar que, quando procuramos traçar características gerais de um determinado movimento, corremos o risco de não estarmos sendo completamente exatos e justos naquilo que queremos descrever, além de sempre existir a possibilidade de exceções que acabam não sendo abordadas.


Pentecostalismo e o neopentecostalismo

William Saymor

O pentecostalismo surgiu no fim do séc. XIX e início do séc. XX. Os pentecostais gostam de rememorar com carinho dos acontecimentos relatados no movimento da Rua Azuza, 312, liderado por William Saymour.

Saymor era um homem negro, em um país terrivelmente racista. Ele se interessou acerca das ideias de Charles Parham, líder branco, um dos primeiros a divulgar a questão dos dons do Espírito Santo, notadamente o falar em línguas. Mas tendo em vista a questão racial, Saymor não podia assistir as palestras de dentro da sala, e sim, do lado de fora.

Fato é que coube a Saymour a liderança de um dos movimentos mais grandiosos e explosivos do protestantismo moderno. O movimento da Azuza, liderado por negros, atraia também muitos brancos e hispânicos, sendo, pelo menos momentaneamente, derrubada as barreiras raciais. Entretanto, o racismo norte americano não demorou a reaparecer e acabar por prevalecer, havendo, para tristeza de Saymor, a retirada dos brancos do movimento. Influenciadas por este movimento, surgiram duas grandes igrejas, que foi a igreja de Deus em Cristo e a Assembleia de Deus.

Quais características mais marcantes podem vislumbrar na espiritualidade pentecostal?

Notadamente, a busca pelos dons carismáticos é uma das características mais acentuadas do movimento pentecostal, havendo ênfase para o chamado “Batismo com o Espírito Santo”. Sem entrar em nuanças doutrinárias, grande parte do movimento viu no dom de línguas uma evidência de tal batismo. Reuniões eram realizadas na busca pela experiência da glossalia. Por vezes, chegou-se a considerar tal dom como um requisito para ordenação de lideranças. Geralmente, era uma reunião em que algum pregador carismático despertava, pela sua pregação, o interesse da comunidade na busca do referido dom, seguido de orações de busca, que poderiam ser em tom bastante alto, em que todos oram de uma vez (o que difere do modo de orar das igrejas históricas). Entretanto, outros dons também são relatados no seio do movimento, como o próprio dom de interpretar línguas, a profecia, o exorcismo, a cura divina, entre muitos outros.

Outro fator que caracterizou boa parte do movimento, pelo menos no Brasil, foi um forte tipo de “ascetismo”. Havia uma rígida forma de se vestir por parte dos homens, mas principalmente das mulheres, um antagonismo contra a utilização da televisão, uma radical rejeição da bebida e do cigarro, bem como de outros vícios, e mesmo em relação aos esportes; enfim, uma radical rejeição do que consideravam “mundanismo”. Em um primeiro momento, mesmo a reflexão teológica mais profunda foi considerada prejudicial, ou seja, “a letra que mata”. O movimento se espalhou rapidamente pelas camadas mais pobres da população brasileira, sendo que, no fim do séc. XX, a grande maioria dos evangélicos brasileiros é pentecostal, fazendo-se sentir sua influência mesmo nas igrejas históricas tradicionais, e mesmo no catolicismo romano.

Em meados do sec. XX surgiu um movimento que ficou conhecido como neopentecostalismo. Muito se tem escrito sobre tal movimento, muitas vezes em tom crítico. O movimento também cresceu muito, liderado no Brasil por muitas igrejas como a Universal do Reino de Deus.

A teologia que embasa tal movimento é conhecida como teologia da prosperidade, produzindo uma espiritualidade peculiar. Entre tais características de tal espiritualidade, podemos mencionar a ideia de que, se o fiel praticar determinados atos religiosos, e tiver fé, poderá ter prosperidade financeira, familiar, e inclusive ser curado  de todas as suas doenças.  Os clérigos que lideram tal movimento costumam ter vidas bastante prósperas, do ponto de vista financeiro. Alguns críticos já escreveram no sentido de opinar que ocorre uma relação de consumo em relação a tais igrejas, consideradas “de mercado”, que não costumam de lista de membros. O fiel procura a igreja para suprir algum tipo de necessidade, cumprindo os requisitos para tanto, que geralmente envolvem questões de ordem financeira. Ao contrário dos antigos pentecostais, os neopentecostais usaram dos meios de comunicação para propagar sua mensagem, a fim de alcançar o maior número possível de adeptos. Isso, de certa forma, impactou todo o mundo religioso, mais aberto também aos meios de comunicação. Pode-se dizer que, também doutrinariamente, não parecem se ligar a muitos pontos que unem os protestantes tradicionais.

Algo interessante que podemos notar na eclesiologia de toda a igreja neopentecostal é uma radical hierarquização, bastante parecida até com a da igreja romana. Definitivamente, as eclesiologias do protestantismo histórico e tradicional foram completamente rejeitadas pelo movimento, havendo uma forte centralização de poder, sucumbindo muitas vezes para o próprio culto à personalidade do líder. Os líderes em tais igrejas parecem exercer mais poder em suas denominações do que o pontífice romano no catolicismo.




[1] Existe o ecumenismo restrito, que também é fruto de um protestantismo mais tradicional, mas que envolve somente as chamadas confissões cristãs.

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